por Camillo Giamundo

A Lei nº 8.666/93 não havia dedicado capítulo ou seção específica para os critérios de julgamento, como fez a Lei nº 14.133/21. As definições e instruções de avaliação das propostas nos certames estavam vinculadas aos “tipos de licitação”, expressão não mais utilizada no novo diploma legal.

Na Lei 8.666/93, o artigo 44 dispunha que, no julgamento das propostas, a Comissão deve levar em consideração critérios objetivos, previamente definidos no edital ou convite, e que não devem contrariar as normas e princípios estabelecidos na lei.

No artigo 45, o diploma legal previa que, além dos critérios objetivos, previamente definidos no edital, a Comissão de licitação ou o responsável pelo convite deveria, quando do julgamento das propostas, realizá-lo em conformidade com os tipos de licitação: (i) menor preço; (ii) melhor técnica; (iii) técnica e preço; e (iv) maior lance ou oferta, em casos de alienação de bens ou concessão de direito real de uso.

Com a atualização, a Lei nº 14.133/21 manteve similares os quatros critérios acima identificados, trazendo ainda, em seu artigo 33 e incisos II e VI, os critérios de maior desconto e maior retorno econômico.

Apesar da novidade da previsão legal, os novos critérios estabelecidos na Lei nº 14.133/21, a bem da verdade, apenas tipificam práticas já costumeiras em certames licitatórios, sendo oportuna a sua inclusão e previsão.

A definição do critério de julgamento enseja a vinculação da Administração Pública licitante quanto à análise e seleção das propostas, especificamente quanto ao foco específico pretendido e priorizado quando da escolha.

Isso porque, a título exemplificativo, embora em uma licitação que utilize o critério de julgamento de “menor preço” haverá previsão de atendimento a requisitos mínimos de qualificação técnica por parte dos proponentes, em um certame em que se adotar o critério “técnica e preço”, tais exigências deverão ter uma importância, complexidade e definição muito mais aprofundada.

A importância da definição do critério de julgamento, portanto, vincula a Administração Pública, que deverá estipular regras claras, objetivas e adequadas ao “tipo” por ela selecionado e que melhor se adeque ao objeto da futura contratação, evitando-se subjetivismos, dúvidas e incertezas quanto ao procedimento a ser seguido não apenas por ela, mas pelos proponentes interessados.

 

  • Menor preço (Art. 33, inc. I)

A antiga Lei nº 8.666/93, em seu art. 45, §1º, inciso I, definia “menor preço” como sendo o critério de seleção da proposta mais vantajosa para a Administração em que se determinava vencedor o licitante que apresentasse a proposta de acordo com as especificações do edital ou convite e ofertasse o menor preço.

O critério “menor preço” foi mantido, no artigo 33, inciso I, da Lei nº 14.133/21, e o conceito de tal julgamento ganhou destaque no artigo 34, ao preconizar que o julgamento por menor preço “considerará o menor dispêndio para a Administração, atendidos os parâmetros mínimos de qualidade definidos no edital de licitação”.

Significa dizer que, na nova Lei nº 14.133/21, a preocupação do legislador é clara: não basta que a proposta do licitante seja a mais econômica. Ela só será a mais vantajosa se o proponente também atender aos parâmetros mínimos de qualidade definidos no edital de licitação.

A novidade trazida pela Lei nº 14.133/21 diz respeito ao §1º do art. 33, que dispõe que os custos indiretos relacionados com as despesas de manutenção, utilização, reposição, depreciação e impacto ambiental do objeto licitado poderão ser considerados para a definição do menor dispêndio, desde que objetivamente mensuráveis, conforme disposto em regulamento.

Além disso, a adoção do critério de julgamento pelo menor preço também deve observar, quando do recebimento, análise e julgamento das propostas dos licitantes, o disposto no artigo 23 da Lei nº 14.133/21 (sem correspondência com a Lei 8.666/93), que preconiza que o valor previamente estimado da contratação deverá ser compatível com os valores praticados pelo mercado, considerados os preços constantes de bancos de dados públicos e as quantidades a serem contratadas, observadas a potencial economia de escala e as peculiaridades do local de execução do objeto.

É de se destacar que, da leitura das novidades do diploma legal, tem-se a seguinte conclusão: nem sempre o preço nominalmente mais baixo poderá significar a proposta mais vantajosa. Há que se observar (i) a compatibilidade com os valores de mercado – evitando-se valores inexequíveis e irreais –, e (ii) o atendimento a parâmetros mínimos de qualidade definidos no edital de licitação – fator este que interfere na identificação do preço e da vantajosidade da proposta –, em busca do atendimento do objetivo de menor dispêndio para a Administração.

 

  • Maior desconto (Art. 33, inc. II)

O critério de “maior desconto”, apesar de não previsto na extinta Lei nº 8.666/93, não é bem uma novidade legislativa. Isso porque, a Lei Federal nº 12.462, de 04 de agosto de 2011, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC, em seu artigo 18, inciso I, já previa o critério “maior desconto”, equiparando-o ao critério de “menor preço”, devendo ser considerado o menor dispêndio para a Administração Pública, tendo como referência o preço global fixado no instrumento convocatório, sendo o desconto estendido aos eventuais termos aditivos (art. 19, §2º), e que, em caso de obras ou serviços de engenharia, o percentual aplicado deve incidir linearmente sobre os preços de todos os itens do orçamento estimado pelo instrumento convocatório (art. 19, §3º).

Também a Lei Federal nº 13.303, de 30 de junho de 2016, que dispõe sobre o estatuto jurídico das empresas públicas, das sociedades de economia mista e suas subsidiárias, em seu artigo 54, inciso II, trouxe o critério de julgamento de “maior desconto”, trazendo um adendo de que o percentual oferecido nas propostas ou lances vencedores se estendem a eventuais aditivos (§4º, inciso I).

E, por último, o Decreto nº 10.024, de 20 de setembro de 2019, que regulamenta o pregão eletrônico para a aquisição de bens e a contratação de serviços comuns, incluídos os serviços comuns de engenharia, e dispõe sobre o uso da dispensa eletrônica, no âmbito da Administração Pública Federal, que em seu artigo 7º também previu como critério de julgamento o “maior desconto”.

A Lei nº 14.133/21, por sua vez, instituiu o maior desconto como um dos critérios de julgamento, prevendo que o preço estimado ou o máximo aceitável constará do edital da licitação (art. 24, parágrafo único), e que terá como referência o preço global fixado no edital de licitação, de modo que o desconto será estendido aos eventuais termos aditivos (art. 34, §2º).

Logo, e a partir da nova Lei de Licitações, o proponente deverá se atentar, quando da oferta do desconto, que o percentual aplicado restará vinculado até o encerramento do contrato, mesmo em sede de novos aditamentos.

Embora não seja o tema do presente artigo e afeto aos critérios de julgamento, entende-se que a regra da aplicação do mesmo percentual desconto, incidente na proposta vencedora, em futuros aditivos não é condição absoluta.

Isso porque, verificado que o desconto, ao tempo futuro, não mais representar os valores praticados de mercado, deve ele ser reconsiderado, evitando-se a onerosidade excessiva do particular contratado.

 

  • Melhor técnica ou conteúdo artístico (Art. 33, inc. III)

Critério utilizado para contratação de projetos e trabalhos de natureza técnica, científica ou artística, a melhor técnica ou conteúdo artístico consiste na avaliação exclusiva das propostas técnicas ou artísticas apresentadas pelos licitantes, devendo o edital definir o prêmio ou a remuneração que será atribuída aos vencedores (art. 35, Lei nº 14.133/21).

Quando do julgamento das propostas, deve-se seguir o procedimento previsto no art. 37 da Lei 14.133/21, sendo inicialmente a verificação da capacitação e experiência técnica do proponente, por meio de atestados técnicos.

Deverão ser atribuídas, ainda, notas a quesitos de natureza qualitativa, por banca avaliadora designada para esse fim, de acordo com orientações e limites definidos no edital, devendo ser considerados a demonstração de conhecimento do objeto, a metodologia e o programa de trabalho, a qualificação das equipes técnicas e a relação dos produtos que serão entregues.

A banca avaliadora deverá ser composta por, no mínimo, três membros e pode ser composta por servidores efetivos ou empregados públicos pertencentes aos quadros permanentes da Administração Pública ou por contratação de profissionais de conhecimento técnico, experiência ou renome na avaliação dos quesitos especificados em edital, desde que seus trabalhos sejam supervisionados por profissionais designados pela autoridade competente.

A última etapa do julgamento consiste na atribuição de notas por desempenho do licitante em contratações anteriores, e que deve ser aferida por meio de documentos comprobatórios (art. 88, § 3º da Lei 14.133/21) e em registro cadastral unificado disponível no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP).

A Lei 8.666/93 não previa a expressão “melhor conteúdo artístico”, adotada no novo diploma legal. A inclusão é oportuna, na medida em que se busca diminuir a contratação por inexigibilidade no setor artístico e passa a conferir maior competitividade na disputa, com requisitos a serem obedecidos e atendidos pela Administração Pública na escolha do conteúdo buscado.

 

  • Técnica e preço (Art. 33, inc. IV)

Já previsto na extinta Lei nº 8.666/93 (art. 45, §1º, inc. III), o critério de julgamento pela técnica e preço foi mantido na nova lei de licitações, e leva em consideração a maior pontuação obtida a partir da ponderação, segundo fatores objetivos a serem previstos no edital, das notas atribuídas aos aspectos de técnica e de preço da proposta.

O critério de julgamento pela técnica e preço deve ser escolhido, pela Administração, quando o estudo técnico preliminar demonstrar que a avaliação e a ponderação da qualidade técnica das propostas que superarem os requisitos mínimos estabelecidos no edital forem relevantes aos fins pretendidos nas licitações.

Note-se que os fatores objetivos de pontuação são obrigatórios e vinculatórios, atendendo ao princípio do julgamento objetivo, consagrado no artigo 5º da Lei nº 14.133/21, que conjuga a um só tempo os princípios da isonomia, impessoalidade e vinculação ao instrumento convocatório – o qual deverá nortear toda a realização do procedimento licitatório, e de onde se extrai que o julgamento deverá ser pautada pelos critérios objetivamente fixados no edital.

Significa dizer que não há espaço para o subjetivismo, para a avaliação da proposta do licitante com base em valores e critérios obscuros, não palpáveis ou de difícil aferição.

O edital deverá dispor, de maneira clara e objetiva, os critérios que serão levados em consideração quando da avaliação das propostas, identificando os pontos a serem apresentados pelos proponentes para justificar a gradação de notas ou do julgamento de qual proposta é a mais adequada ao objeto do futuro contrato.

Quanto à aferição da pontuação dos proponentes, a Lei nº 14.133/21 prevê que as propostas técnicas deverão ser avaliadas e ponderadas e, em seguida, as propostas de preço, na proporção máxima de 70% (setenta por cento) de valoração para a proposta técnica.

Tal proporção e percentuais de avaliação da proposta técnica e da proposta comercial não eram previstos na Lei nº 8.666/93, porém eram de usual e comum utilização pelos entes licitantes, reconhecidos inclusive pelo Tribunal de Contas da União.

O julgamento das propostas segue a mesma dinâmica do critério melhor técnica ou conteúdo artístico, prevista no art. 37 da Lei 14.133/21, a partir da verificação da capacitação e experiência técnica do proponente por meio de atestados técnicos, com atribuição de notas a quesitos de natureza qualitativa, por banca avaliadora designada para esse fim, de acordo com orientações e limites definidos no edital, considerando-se a demonstração de conhecimento do objeto licitado, a metodologia e o programa de trabalho previstos, a qualificação das equipes técnicas e a relação dos produtos que serão entregues.

Não menos importante, a última etapa do julgamento da proposta técnica deve levar em consideração a atribuição de nota por desempenho do licitante em contratações anteriores, a ser aferida via documentos comprobatórios (art. 88, § 3º da Lei 14.133/21).

Ainda, a pontuação referente à qualificação técnico-profissional, tal como no caso de certames que utilizem o critério da melhor técnica, exigirá que a execução do respectivo contrato tenha participação direta e pessoal do profissional correspondente (art. 38).

Por fim, há um importante destaque da nova lei de licitações, em seu artigo 34, de que o julgamento por técnica e preço também considerará o menor dispêndio para a Administração, atendidos os parâmetros mínimos de qualidade definidos no edital de licitação. A princípio, a leitura do dispositivo em questão e o procedimento de julgamento pelo critério técnica e preço poderia levar à confusão de conceitos: afinal, a Administração deve considerar a média ponderada das notas técnica e comercial – que nem sempre representa o menor valor proposto dentre os licitantes – ou o menor valor dentre todas as propostas de preço?

A resposta está no significado de “menor dispêndio”, que não é sinônimo de “menor preço”. Menor dispêndio é a conjunção de diversos fatores, a saber: (i) a compatibilidade com os valores de mercado – evitando-se valores inexequíveis e irreais –, e (ii) o atendimento a parâmetros mínimos de qualidade definidos no edital de licitação – fator este que interfere na identificação do preço e da vantajosidade da proposta –, em busca do atendimento do objetivo de menor dispêndio para a Administração.

Nem sempre um licitante que apresenta o menor preço demonstrará o melhor e mais suficiente conhecimento do objeto licitado, da metodologia e do programa de trabalho previstos, da qualificação das equipes técnicas e da relação dos produtos que serão entregues. Assim como aquele que demonstrar domínio e preponderância dos aspectos técnicos, frente aos demais licitantes, pode não lograr apresentar o melhor preço. A chave está no atendimento mais satisfatório, conforme percentuais de ponderação, do objeto licitado.

 

  • Maior lance, no caso de leilão (Art. 33, inc. V)

A Lei nº 8.666/93 previa o critério de “maior lance ou oferta – nos casos de alienação de bens ou concessão de direito real de uso”, tendo a redação da nova lei de licitações alterado para “maior lance, no caso de leilão”.

O leilão é a modalidade de licitação que a Administração Pública pretende alienar bens imóveis ou de bens móveis inservíveis ou legalmente apreendidos a quem oferecer o maior lance (art. 6º, inciso XL). Daí a incidência do critério de julgamento de maior lance, em que o maior retorno financeiro representa o objetivo da licitação promovida.

Importante observar que a definição trazida pelo art. 6º, inciso XL, da Lei nº 14.133/21, acabou por excluir a previsão de leilão para concessão de direito real de uso, até então prevista na Lei nº 8.666/93. Significa dizer que o novo diploma legal prevê o critério da maior proposta financeira (maior lance) apenas a bens imóveis ou de bens móveis inservíveis ou legalmente apreendidos, e não aos casos de concessão de direito real de uso.

 

  • Maior retorno econômico (Art. 33, inc. VI)

Assim como as alterações trazidas pela nova Lei de Licitações, o maior retorno econômico não é bem uma novidade em certames licitatórios. A Lei nº 12.462/11, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC, bem como a Lei nº 13.303/16, que trata das empresas estatais, já previam tal critério de julgamento.

Com a atualização da lei de licitações, o critério de maior retorno econômico passa a ser norma geral, já que não havia previsão na então Lei nº 8.666/93.

O julgamento pelo critério de maior retorno econômico deve ser utilizado exclusivamente para a celebração de contrato de eficiência, em que o contratado tem o compromisso de gerar economia de despesa à Administração, de modo que a sua remuneração estará condicionada ao desempenho eficiente de tal atividade.

O procedimento previsto no novo diploma legal traz, como requisitos dos licitantes, a necessidade de apresentar proposta de trabalho que contemple as obras, os serviços ou os bens, com os respectivos prazos de realização ou fornecimento, bem como a economia que se estima gerar, expressa em unidade de medida associada à obra, ao bem ou ao serviço e em unidade monetária (art. 39, §1º, inc. I, “a” e “b”).

Quanto à proposta comercial, a regra é que deva corresponder ao percentual sobre a economia que se estima gerar durante determinado período, expressa em unidade monetária (art. 39, §1º, inc. II).

Para a Administração Pública, há o compromisso de formular edital que preveja parâmetros objetivos de mensuração da economia gerada com a execução do contrato, que servirá de base de cálculo para a remuneração devida ao contratado. Para efeito de julgamento da proposta, o retorno econômico será o resultado da economia que se estima gerar com a execução da proposta de trabalho, deduzida a proposta de preço.

Assim, quando do julgamento das propostas, a Comissão encarregada pelo certame deve aferir o maior retorno econômico a partir da dedução entre a proposta de preço e a economia que o licitante estima gerar, sendo que, nos casos em que não for gerada a economia prevista no contrato de eficiência, a remuneração do contratado será descontada caso o seu desempenho fique abaixo da expectativa firmada na formalização da proposta.

É um meio encontrado pela lei para incentivar o particular contratado a executar o contrato sob o viés e objetivo do interesse público, a partir da economia de recursos, na medida em que sua remuneração será diretamente afetada. O objetivo é fazer com que o particular busque a lucratividade do seu negócio sem se afastar do interesse público naquela contratação.

Ponto de atenção é trazido pelo inciso II do §4º do artigo 39 da Lei nº 14.133/21, que prevê que se a diferença entre a economia contratada e a efetivamente obtida for superior ao limite máximo estabelecido no contrato, o contratado ficará sujeito, ainda, a outras sanções cabíveis.

É evidente que em cenários imprevisíveis e inevitáveis, em que a economia contratada pode não ser atingida, a sanção deve ser avaliada, caso a caso, observando-se criteriosamente a conduta do particular contratado e se sua proposta de trabalho e de preço correspondiam a uma realidade factível, acometida por situação de difícil – ou de impossível – previsão, como é o caso de crise de mercado decorrente de uma pandemia, por exemplo.

Inexistindo tais hipóteses, o particular contratado deve estar atento quando da elaboração da proposta de trabalho e de preço, para evitar sanções.

Artigo originalmente publicado no Portal Consultor Jurídico, em 29.02.2024.