por Christian F. Rosa e Bruna de O. Farias
Com a vigência da Lei Geral e Proteção de Dados – LGPD, desde 2020, a Lei de Acesso à Informação – LAI perpassa por novas provocações, agora em face da necessidade de compatibilização entre a proteção de dados pessoais e a transparência pública. De plano, que se registre: é plenamente possível a manutenção de uma boa gestão pública, alinhada aos preceitos de controle social e de privacidade, desde que se saiba ponderar os objetivos normativos incidentes, à luz dos direitos e deveres veiculados por cada um destes dois instrumentos legais.
Certamente, a LGPD tem sua relevância para as ações de transparência pública ao passo que dispõe sobre regras aplicáveis tanto para o setor privado quanto ao setor público, ao disciplinar quando e como o tratamento de dados pessoais é aceitável e lícito. Entretanto, não é menos verdade que a LAI já trazia regras quanto ao tratamento de informações pessoais no âmbito de sua aplicação.
A LAI expressamente impõe ao Poder Público o dever de assegurar a proteção da informação sigilosa e de caráter pessoal. Na gestão transparente destes dados, a Administração também já estava vinculada ao dever de respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como às liberdades e garantias individuais. Inclusive, com a Emenda Constitucional n.º 115, neste rol de garantias individuais, consolida-se em definitivo o dever de respeito ao direito à proteção dos dados pessoais, que já havia sido reconhecido como garantia fundamental autônoma pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (ADI 6387 MC).
Assim, se de um lado a LGPD apenas reforçou a tutela do direito à privacidade, já protegido pela Lei de Acesso à informação. De outro lado, ao contrário do que se imagina, a nova Lei de Proteção aos Dados Pessoais passou a exigir todo um novo campo de maior transparência por parte das entidades públicas, deste modo reforçando as diretrizes da Lei de Acesso à Informação.
Isso porque restou de fato à LGPD impor ao Poder Público o dever de transparência sobre como realiza o tratamento dos dados pessoais sob seu controle. É dizer que, ao passo que pela LAI o cidadão adquire os meios para ter acesso a quais dados são armazenados pela Administração, com a LGPD, o cidadão incorpora no complexo de direitos subjetivos, de que é titular, o direito de saber sob qual fundamento legal, a finalidade, os procedimentos e as práticas que se dão o tratamento destes dados.
A própria LGPD traz um rol de regras aplicáveis somente ao tratamento de dados pessoais pelo Poder Público, que estão sujeitas a questionamentos legítimos – como foi com a LAI, já em vigor há tantos anos. Assim, nesse sentido positivo, a LGPD complementa a LAI, pois incrementa a accountability – responsabilidade e engajamento – do Poder Público pela boa gestão de informações, neste caso de dados de caráter pessoal.