Licitação em bloco de Santos Dumont e Galeão em 2023 é viável e pode fortalecer Estado como “hub” nacional

A licitação conjunta dos aeroportos Santos Dumont e Galeão, no segundo semestre do ano que vem, é positiva não apenas para o Rio de Janeiro, mas para o sistema de aviação civil do país. E há tempo hábil para se desenhar uma modelagem que permita a licitação dos dois ativos em 2023.

Essa é a visão de especialistas consultados pelo Valor, segundo os quais é possível o leilão no ano que vem mesmo com uma possível mudança de governo. Segundo eles, a união dos dois aeroportos em um único bloco vai criar um sistema capaz de fortalecer a cidade como um “hub” de distribuição interna, sem que se corra o risco de aumento tarifário.

A decisão de licitar os dois aeroportos em um único bloco em 2023 foi anunciada pelo ministro Tarcísio Freitas após a concessionária RioGaleão, cujo controlador é a cingapuriana Changi, confirmar pedido de relicitação.

Para Delmo Pinho, ex-secretário de Transportes do Rio e representante da Fecomércio-RJ no grupo de trabalho que discutia com o governo federal a modelagem para a licitação do Santos Dumont, “é muito ruim para o país quando um grande operador internacional sai” de uma concessão.

Mas Pinho pondera que a saída da Changi criou um cenário mais favorável para o Rio voltar a ser “hub” relevante na aviação nacional. “O novo dono da concessão não vai dar tiro no pé e o resultado pode ser excelente para Rio e Brasil. Teremos concorrente de peso num mercado importantíssimo e trabalhando de forma cooperada”.

Para ele, é possível licitar os dois aeroportos conjuntamente no 2º semestre de 2023, mesmo considerando possível mudança de governo após as eleições. “Uma modelagem bem feita e de consenso não se muda. Temos esse ano para chegar a um consenso”, ressalta, lembrando que é preciso uma cláusula de barreira que impeça participação de concessionários de  ativos como Guarulhos, Viracopos e Brasília no leilão. “Temos que impor cláusulas de barreira para evitar monopólio privado.”

Eduardo Rebuzzi, representante da Associação Comercial do Rio no grupo de trabalho do Santos Dumont, nega que dois aeroportos geridos pelo mesmo concessionário signifique risco de monopólio. “Uma vez adquiridos pela mesma empresa, é óbvio que [concessionários] vão procurar criar equilíbrio entre os dois aeroportos”, diz.

Para o advogado Luiz Felipe Graziano, sócio do Giamundo Neto Advogados, a licitação em 2023 é “totalmente factível”, mesmo com a dependência de novas etapas, como audiências públicas e análise do Tribunal de Contas da União (TCU). “O combustível para viabilizar a licitação é a convergência de interesses”.

Graziano também lembra que a iniciativa de concessão de ativos aeroportuários começou a ser modelada e realizada ainda no governo da ex-presidente Dilma Rousseff, passou por Michel Temer e continuou com Jair Bolsonaro. “Como isso atravessou três governos com perfis bem diferentes, é possível que sobreviva a uma alternância de poder.”

Maurício Menezes, sócio do escritório Moreira Menezes Martins, diz que unir os aeroportos “acaba sendo uma solução”, mas pondera que há a necessidade de um “amplíssimo” diálogo com a iniciativa privada. “É uma oportunidade para reflexão sobre a melhor forma [de fazer a modelagem] não apenas pela ótica do setor público, mas principalmente do privado.

Ele ressalta que não haverá competição “deletéria” entre os aeroportos, e acrescenta que há a vantagem da diluição de riscos, com dois ativos grandes no mesmo bloco. Menezes minimiza temores sobre encarecimento de tarifas pois, diz, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) tem poderes para evitar a escalada tarifária.

Em entrevista à “Veja” no fim de semana, o ministro disse que não é o Santos Dumont que rouba passageiros do Galeão, mas o Rio que perde visitantes. A declaração foi rebatida pelo prefeito do Rio, Eduardo Paes, no Twitter, para quem as declarações do ministro a respeito do Galeão “são sempre equivocadas, não condizentes com a verdade e pouco elegantes com o Rio”. Ele pediu para “parar de conversa fiada com o Rio”.

Matéria originalmente publicada em 13.02.2022, por Rafael Rosas, no Valor Econômico.