por Camillo Giamundo e Leonardo Muradian Cundari

Desde 30/12/23, a Lei de Licitações (lei 14.133/21) unifica normas antigas. Destaque para a inovação na fase de habilitação, abrangendo habilitação jurídica, técnica, fiscal, social, trabalhista e econômico-financeira.

 

Desde o dia 30 de dezembro de 2023, a nova Lei de Licitações (lei 14.133/21) passou a regular, de forma exclusiva, todos os assuntos englobados pelas antigas normas previstas na antiga lei 8.666/93, na Lei do Pregão (lei 10.520/02) e parcela da Lei do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (arts. 1° a 47-A da lei 12.462/11).

Uma das maiores preocupações das empresas participantes de licitações está na inovação da nova Lei de Licitações quanto à fase de habilitação do processo licitatório. Essa etapa é definida, pelo art. 62, como a fase em que o licitante deverá comprovar, por meio de informações e documentos, sua capacidade de realizar o objeto da licitação a partir de quatro pilares: (1) a habilitação jurídica; (2) qualificação técnica; (3) fiscal, social e trabalhista e (4) a habilitação econômico-financeira.

Em comparação com a lei 8.666/93, a nova Lei de Licitações trouxe pequenas mudanças tanto estruturais como materiais.

No tocante às mudanças estruturais, o que era exceção, na antiga lei, agora será regra: a inversão de fases do procedimento licitatório. Diferente da lei 8.666, a regra geral do artigo 17 da nova lei prevê que primeiro serão apresentadas as propostas comerciais e lances, com o respectivo julgamento, para posterior análise e verificação da habilitação dos proponentes. A despeito de haver previsão legal para que, por meio de disposição editalícia, a fase de habilitação anteceda estas outras mencionadas, isso será excepcional (art. 17, §1º), mediante a necessidade de comprovação dos benefícios decorrentes desta “inversão da inversão”.

Além dessa modificação estrutural, pode-se notar que a Seção II do Capítulo II (“Da Habilitação”) teve seus requisitos expandidos. Um importante exemplo é a exigência de vagas para pessoas com deficiência e reabilitados da Previdência Social. Essa reserva, que era disposta na antiga lei apenas como um critério de desempate, agora foi incorporada na nova lei como um critério obrigatório de habilitação.

No entanto, tais requisitos se enquadram em situações específicas, como, por exemplo, a reserva de vagas para pessoas com deficiência e reabilitados será exigida de empresas com 100 ou mais empregados, variando, daí em diante, de 2% a 5% dos cargos destinados ao público em questão, aumentando ou diminuindo conforme a quantidade, conforme lei específica (lei 8.213/91). Consequentemente, empresas com um quadro de funcionários que não atinja a quantia mínima não estarão obrigadas a comprovar o cumprimento desse requisito.

Além disso, recentemente a nova Lei de Licitações foi regulamentada para exigir ações em benefício das mulheres e da igualdade de gênero. O decreto 11.430/23, assinado no Dia Internacional da Mulher e incorporado à nova Lei de Licitações, dispõe sobre a exigência, em contratações públicas, de percentual mínimo de mão de obra constituída por mulheres vítimas de violência doméstica e sobre o desenvolvimento, pelo licitante, de ações de equidade entre homens e mulheres no ambiente de trabalho como critério de desempate em licitações. A despeito de não se enquadrar em um requisito obrigatório de habilitação, a constatação dessas práticas será levada em conta em casos de desempate, como um diferencial positivo e, portanto, classificatório.

A disposição acima, por sua vez, aplica-se em casos de contratação de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, havendo de reservar um percentual mínimo de 8% das vagas para o público referido.

Outro ponto relevante diz respeito à habilitação econômico-financeira, prevista pela nova lei. Agora, exige-se que o licitante apresente balanço patrimonial e demonstração de resultado de exercício e demais demonstrações contábeis dos dois últimos exercícios sociais.

É possível notar, portanto, que o legislador incorporou tanto demandas sociais quanto requisitos mais específicos e detalhados de capacitação das licitantes. O motivo para tal caminho seguido pode ser visto enquanto consequência positiva da inversão de fases: uma vez que a análise da documentação será posterior às fases de proposta comercial e julgamento, o número de licitantes que terão atingido essa fase será menor e, portanto, a verificação documental poderá ser mais exaustiva, detalhada e profunda com relação às empresas, sem defasagem na celeridade do procedimento licitatório.

Dessa maneira, espera-se que haja mais celeridade e menor dispêndio de tempo com análise de documentos de empresas que, conforme o rito da lei antiga, nem seriam classificadas, mas teriam seus documentos analisados. Agora, apenas a licitante vencedora seguirá para a fase de habilitação, gerando uma forma de economia procedimental.

Pode-se, ademais, considerar que a redução da morosidade se dará também por meio da preferência pela forma eletrônica das licitações (art. 17, §2°), pois evidentemente agiliza e facilita a apresentação de documentos e sua posterior análise pela Administração Pública. Será possível, apesar disso, a escolha pela forma presencial, contanto que devidamente justificada. Todavia, espera-se que a Administração licitante esteja atenta à segurança do sistema eletrônico e à estrutura de proteção aos documentos concedida aos licitantes, evitando fragilidades, dúvidas ou espaço para o cometimento de fraude ou acesso indevido aos documentos por terceiros, violando-se o sigilo do procedimento.

Por fim, nada mais didático e conclusivo do que uma tabela com as principais alterações decorrentes do tema discutido, apontando as possíveis também vantagens e desvantagens que podem ser deduzidas das novas regras de habilitação da nova Lei de Licitações:

 

Artigo originalmente publicado no site Migalhas, em 31/01/2024