Legislação estimula coleta seletiva e economia circular; dificuldades de infraestrutura seguem como entraves
Aprovada em 2010 pelo Congresso Nacional, a Política Nacional de Resíduos Sólidos incentiva práticas que se alinham ao conceito de economia circular, como a logística reversa e a coleta seletiva, que pode promover avanços na reciclagem de materiais, ampliando a possibilidade de novas iniciativas no setor. Ainda assim, a implementação efetiva da norma esbarra na pouca infraestrutura, principalmente em municípios menores.
Entre as dificuldades, o prazo para o fim dos lixões expirou no último dia 2, mas tais estruturas seguem potencializando focos de contaminação e configuram um incômodo também para as pretensões do Brasil como protagonista na agenda ambiental, a um ano da COP30, que será realizada em Belém (PA). Para entender melhor o contexto que envolve a legislação, a Esfera Brasil ouviu especialistas em infraestrutura e direito ambiental.
Para o advogado Daniel Almeida Stein, sócio do setor de infraestrutura no Giamundo Neto Advogados, a lei oferece grande incentivo a soluções consorciadas, em razão do ganho de escala para sustentabilidade econômica dos projetos e da multiplicação do impacto sobre o meio ambiente, mas a harmonização entre políticas federal, estadual, regional e municipal de resíduos e dos próprios interesses dos respectivos entes públicos representa um grande desafio para a estruturação de projetos.
“Outros desafios são a determinação do objeto da prestação dos serviços numa eventual contratação, face à multiplicidade de frentes que a questão dos resíduos abrange, e a conciliação de interesses na determinação de tarifas para os serviços, pois atualmente, em muitos municípios, o serviço não é cobrado ou é cobrado de forma muito ineficiente”, detalhou.
Redução da burocracia
Conceito cada vez mais presente nos debates de políticas públicas de sustentabilidade, a economia circular abarca a redução do desperdício e otimização dos recursos, mantendo produtos, materiais e recursos em uso pelo maior tempo possível. Segundo João Emmanuel Cordeiro Lima, sócio da Nascimento e Mourão Advogados e professor de Direito Ambiental da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), a legislação, especialmente em matéria ambiental e tributária, precisa incentivar que os resíduos retornem para a cadeia produtiva.
“Em matéria ambiental, isso pode ser feito por meio da redução de burocracias desnecessárias que atualmente ainda incidem sobre algumas operações de gestão e gerenciamento de resíduos. Já no campo tributário, é preciso garantir um tratamento que incentive os agentes econômicos a reciclar, reutilizar e adquirir bens reciclados. Atualmente, em alguns casos, o que existe é justamente o contrário. A aquisição de bens nessa condição é mais cara e mais complexa”, frisou.
A regulamentação do setor e o estímulo à economia circular também guardam oportunidades de novos negócios. “Muito daquilo que é descartado e considerado sem valor possui grande valor econômico e, ao se ressignificar esse conceito por meio da reciclagem e da reutilização, o principal impacto gerado é uma menor pressão para exploração de recursos naturais”, acredita a advogada Ana Chagas, sócia da área de Direito Ambiental, ESG e Mudanças Climáticas do Simões Pires Advogados.
“Temos visto o aumento da conscientização da população em relação ao consumo de produtos mais sustentáveis e um maior investimento em programas de educação ambiental para sensibilizar a população sobre a importância da gestão correta dos resíduos pode aumentar a demanda por produtos e serviços sustentáveis. Uma sociedade bem informada tende a apoiar e consumir de empresas que adotam práticas sustentáveis”, acrescentou a advogada.
Publicado originalmente na Exame.